Imigração Portuguesa na Bahia no Século XIX
A história da comunidade portuguesa no Brasil está intrinsecamente ligada a própria história do país. Para entendermos a formação dessa comunidade no século da fundação da Real Sociedade teremos que nos reportar ao processo de imigração portuguesa para a Bahia no mesmo período.
A comunidade portuguesa no século XIX, já formada por dois núcleos: um já cristalizado na sociedade, oriunda do processo de colonização, e outro, de imigração.
O fluxo controlado refere-se a vinda de portugueses especificamente para suprir à necessidade de mão-de-obra assalariada no setor agrário, principalmente do café paulista, devido ao término da escravidão. Na Bahia, esse fluxo não possuiu volume expressivo, pois a crise do setor agro-exportador foi muito forte atingindo toda dinâmica de mercado. Os produtores ou fazendeiros não podiam sustentar um programa de imigração.
O fluxo livre ou espontâneo, mais comum na Bahia, consistia na entrada de portugueses para atividades comerciais, prioritariamente, marítimas ou no setor de serviços como padarias, marcenarias, alfaiatarias, etc.
Os portugueses que vinham para o Brasil, dentro do modelo do fluxo livre, para fazer fortuna engajando-se nas mais diversas atividades eram maioritariamente homens jovens e solteiros de 10 a 14 anos. Migravam geralmente sozinhos e com destino definido.
A situação em Portugal era de crise e o desemprego era crônico. A reestruturação política do país somada a problemas de direcionamento do investimento e da montagem da infra-estrutura básica para movimentar o setor agrário gerou uma violenta crise na zonal rural. Porém esses investimentos e prioridades que estavam aliados a um processo de desenvolvimento encontrou barreiras para crescer devido a ausência da base industrial impedindo uma dinâmica acelerada, necessária ao grande volume de capital pertencentes aos países centrais do sistema.
Esse quadro de crise forçou muitos jovens a buscar alternativas que suprissem ao menos suas necessidades imediatas, principalmente as da sua família empobrecida; bem como fugir do serviço militar obrigatório.
Emigrar para o Brasil espontaneamente ou contactar parentes que lá já estivessem, parecia uma boa saída. Era comum o próprio parente chamar o jovem para trabalhar com ele em seu comércio. A maioria dos imigrantes que vinham para a Bahia eram da região do Porto, pois, já existiam aqui instalados, comerciantes portugueses da mesma região. Por ser Recife e Salvador as maiores praças comerciais portuguesas, locais onde os lusitanos tinham maior prestígio social, eram consequentemente zonas de maior fluxo imigratório.
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Os rapazes que vinham para a Bahia trabalhar no comércio de um patrício, ocupavam primeiramente, a função de caixeiro (comerciante que trabalha na rede de distribuição de retalhos). Os que vinham por conta própria acabavam engajando-se em trabalhos no ambiente portuário. A atividade marítima também era dominada por portugueses, que ocupavam sempre funções de maior responsabilidade, confiança e rentabilidade. Os marítimos eram o segundo maior contigente profissional luso, sendo o primeiro os caixeiros.
Alguns dos portugueses que aqui instalavam-se conseguiam fazer fortuna. A maioria atingia a tão visada fazer a América com a ajuda de outros patrícios. Essa solidariedade inerente à comunidade lusitana foi a responsável por vários atos históricos, como a própria fundação da Sociedade de Beneficência. Tal característica é tão intensa que existem comunidades portuguesas organizadas no mundo inteiro, inclusive um órgão central das comunidades portuguesas – Secretaria de Estado das Comunidades Portuguesas – que visa a integração entre os patrícios e o estudo da cultura portuguesa.
O sonho do retorno à pátria com fortuna para gozar a velhice tranqüila e deixar um caminho mesmo árduo para os filhos e netos era uma constante no pensamento dos lusitanos imigrantes.
Viver como caixeiro dependia do cumprimento de uma ética própria e de uma disciplina rígida, baseadas na solidariedade grupal e nas relações paternalistas, inerentes a cultura moral portuguesa.
Essas regras morais e religiosas deveriam ser seguidas a risca. Os caixeiros vestiam-se de maneira simples, aos novatos não era permitido o uso de pimpão no cabelo, o corte deveria ser rente. Bigode só para marinheiros e soldados, era um atentado a dignidade e a moral, uma ofensa ao patrão. Até as atividades culturais e recreativas que os caixeiros poderiam participar eram limitadas, para evitar más companhias, alegava o superior.
Existia uma hierarquia rígida e formal nas firmas portuguesas, baseada no tempo de serviço e no grau de parentesco com o patrão. Caixeiros antigos no comércio, filhos, sobrinhos e genros do patrão tinham maiores chances de dirigir futuramente os negócios.
Tais condutas garantiam a continuidade dos empreendimentos comerciais e uma solidez da comunidade, que não era numerosa. Viviam na Bahia aproximadamente três mil lusitanos. Esse número não difere muito do que observamos na atualidade.
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Essa comunidade dividia-se em três freguesias da cidade. As freguesias da Conceição e do Pilar, que por serem bairros comerciais concentravam o maior número de portugueses. A proximidade das casas comerciais facilitava o cotidiano. Alguns moravam em sobrados, onde o comércio ficava no térreo e a moradia nos andares superiores. Algumas famílias portuguesas, as mais ricas, transferiram-se do centro da cidade para a freguesia da Vitória, local onde também se concentrava a comunidade inglesa, nobres parceiros comerciais.
Fonte: Hospital Português
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